Olá, eu sou Thomaz Oliveira e essa é Diversa!, espaço onde conversamos sobre comunidade LGBT+ e diversidade.
Chegamos em outubro deste ano incomum (no mínimo) e o Dia das Crianças se aproxima. O que me leva a pensar na criança que eu fui, nas crianças que eu vejo. Em infâncias transviadas.
Imagina você, criança, vivendo o desconforto de imposições de um gênero com o qual você não se sente confortável? Que não é seu! Ou, constantemente sofrendo implicância/agressões por simplesmente não performar o que se espera de masculinidade? E, ao conseguir minimamente verbalizar isso, ser completamente ignorado/a?
Para você entender um pouco melhor essa ideia de infância transviada, aqui estou me referindo a crianças trans, que são crianças que não se sentem contempladas com os gêneros que foram impostos a elas ao nascimento. Nada muito distante da realidade de pessoas trans. Sem esquecer das crianças viadas, infância de pessoas LGBs que não performaram ou performam o que se espera do gênero atribuído a elas.
Existem algumas coisas que precisamos pontuar antes de mais nada, diferentemente do que se espalha por aí, não há nenhuma intervenção cirúrgica ou hormonal em crianças trans. Na realidade, o trabalho passa pela liberdade, em simplesmente deixar ela se expressar e familiar. Orientar famílias a acolher essa criança e simplesmente deixá-la ser – pasmem – crianças!
E eu acredito que isso não esteja tão distante nas infâncias viadas. O trabalho deve ser mais voltado à família, a aceitar essa criança do jeito que ela é. E o nosso, enquanto sociedade, é refletir o impacto das nossas ações nessa criança e o que pode resultar disso. Imagine as marcas na saúde mental de uma pessoa que foi perseguida simplesmente por ser quem é?
Confesso que refletir sobre a minha infância não é tão difícil quanto eu vejo que é para alguns amigos e amigas próximos a mim. Tive alguns marcadores que chegaram a mim antes da feminilidade imposta, que me bastaram por um bom tempo.
Em resumo, eu tive crises de bronquite terríveis, sofri muito, e logo me colocavam na natação para ajudar (e como ajudou), então o argumento pro meu jeito mais ‘bruto’ era ‘que eu era atleta’. Pensar nisso hoje chega a ser meio bobo, mas na época meninos faziam esporte e meninas faziam ballet.
Sem contar que minha mãe não demorou muito pra entender que as bonecas eu quebrava a torto e a direito e os bonecos, adorava e cuidava. Inclusive meu primeiro boneco eu achei na praia (sim!) enterrado na areia no canal 3. Fiquei tão feliz com aquele boneco que minha mãe facilmente entendeu o recado e começou a me dar bonecos e carrinhos.
Entendi minha identidade quase 20 anos depois, foi uma jornada e tanto, mas olhando para trás, tenho a certeza de que vivi uma infância trans, e o mesmo vale para pessoas que perceberam sua identidade de gênero alguns anos depois. O que eu quero dizer aqui é que não se ‘vira’ trans, se é a vida inteira e, cada um leva o seu devido tempo para compreender melhor quem se é. Ou se ama!
O meu real objetivo neste texto é lembrar que criar uma criança é responsabilidade nossa, enquanto sociedade. Então, independentemente da forma como essa criança se expresse, independentemente de quem ela seja cabe a nós PROTEGER essas crianças e permitir que elas sejam apenas crianças. Façamos isso, juntos.
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Ao final de cada texto vou tentar deixar uma sugestão aqui pra vocês, pode ser sobre a temática do dia ou para vocês conhecerem um pouco mais sobre produção LGBT+.
Dica Diversa! do Dia: conheçam a história de Jazz Jennings. Escritora, militante do direito de pessoas trans, Jazz e sua família contam sua história em um reality show. No vídeo abaixo, podemos ver um pouco do processo de entendimento da identidade de Jazz na infância e como a família lidou com isso. Clique aqui
Dica Diversa! do Dia: episódio ‘Quem tem medo de Criança Viada?’ do podcast Santíssima Trindade das Perucas. Um episódio sobre a opressão que pais fazem em filhos LGBTs para suprir suas expectativas e as dificuldades de ser uma criança viada. É fabulosa. Ouça aqui.