Dario Costa e Daniel Maggi: novas apostas na gastronomia santista

Dario Costa inaugura em Santos o seu Madê Cozinha Autoral e Daniel Maggi toca com sucesso a Original Co., enquanto se prepara para novas apostas.

Eles têm atuações diferentes na gastronomia, mas compactuam dos mesmos ideais.

Dario e Daniel chegaram ao universo gastronômico por caminhos distintos, escolheram culinárias que em pouco se assemelham, mas compartilham da crença em uma cozinha autoral com ingredientes frescos, feitos à mão e, sobretudo, valorizam o espaço onde a comida é preparada, atribuindo aos ‘bastidores’ do restaurante a mesma importância que dão ao salão, onde os clientes são servidos.

Daniel Maggi é farmacêutico e chegou no ramo gastronômico por acaso, quando resolveu abrir um restaurante japonês em Santos, seguindo a moda na cidade em 2010. Sonhava em empreender e sempre foi um entusiasta da gastronomia, mas o grande sonho era abrir uma burger house, pois sabia que a culinária japonesa ficaria saturada na cidade em algum momento.

Abriu, em novembro de 2015, a Original Co., já queridinha dos santistas, que ostenta com frequência filas na porta e tem expandido a sua atuação para o delivery e o catering.

Dario Costa começou lavando louça em um restaurante de cozinha ocidental na Nova Zelândia, para onde foi em 2008 para aprender a falar inglês e surfar. Acabou virando cozinheiro e, a partir daí, encontrou uma profissão que lhe permitiria viajar para trabalhar e ‘pegar onda’. Atuou em cozinhas na Itália e em cruzeiros na Indonésia e então voltou para Santos, formou-se em gastronomia na Unimonte e ganhou destaque à frente do inovador Santa Planta, até ser selecionado para o Programa Masterchef Profissionais no ano passado.

Às vésperas de inaugurar o Madê Cozinha Autoral (previsão para outubro), Dario finca de vez em terras caiçaras a bandeira que já erguia no Masterchef, da cozinha com ingredientes locais e sazonais. Com essa crença, Daniel também toca a badaladíssima Original Co. e já se prepara para inaugurar um novo empreendimento, ainda sob sigilo.

Batemos um papo com os dois, em meio às obras – já bem adiantadas – do Madê, que vai ostentar três cozinhas, uma de pré-preparo e uma para confeitaria e panificação (ambas no andar superior) e uma de finalização, no térreo, junto ao salão, onde os clientes acompanharão, sem paredes – e nem vidros – a execução dos pratos.

Confira a entrevista

Existe um novo movimento gastronômico acontecendo em Santos?

Dario – Eu acho que a gente tem que tomar cuidado com esse conceito da nova gastronomia. Há uma mudança na ideia das pessoas não só no Brasil, mas em todo o mundo com relação a isso. A alta gastronomia está sofrendo um baque e a prova disso é que há muitos restaurantes conquistando estrelas no Guia Michelin sem sequer ter menu degustação no cardápio. Isso porque as pessoas estão mais adeptas à comida simples, feita à mão. Por exemplo, quando você pergunta às pessoas sobre a Original Co. dificilmente alguém não vai citar o fato de o pão deles ser feito por eles mesmos.

Daniel – Algo diferente que vem acontecendo em Santos é que nós, que chegamos com novos empreendimentos gastronômicos, estamos aprendendo a formar a mão-de-obra para esse novo perfil de público. Hoje, cerca de 70% dos meus funcionários nós é que formamos e tentamos fazê-los entender que não é só o dinheiro, mas as oportunidades de crescimento. Se um funcionário meu um dia tiver condições de virar um sócio, ele vai virar e pronto. A mentalidade dos novos empresários tem ajudado a mudar o conceito da gastronomia.

Essa mentalidade agregadora também é um ingrediente importante da ‘nova gastronomia’?

Dario – A gente não faz nada sozinho.

Daniel – Eu procuro deixar claro para minha equipe que sem eles o negócio não anda.

Por que essa mudança no hábito de consumir gastronomia?

Dario – Eu acho que a televisão ajudou muito com esse boom de programas de culinária. A TV trouxe a comida para mais próximo das pessoas e elas já vão aos restaurantes sabendo o que querem e como as coisas são produzidas.

Daniel – Há alguns anos atrás quem sabia que o hambúrguer era composto de um blend de carnes, por exemplo? Sem dúvida, as pessoas estão mais informadas e exigentes com relação à comida.

Daniel, o que mudou na sua forma de conduzir o negócio desde que resolveu abrir a Original Co.?

Eu deixei de querer ter controle sobre todos os processos. Quando eu abri, queria controlar tudo e com o tempo fui entendendo que isso não era viável e nem necessário. Por exemplo, eu comprava cerca de duas toneladas de batatas por mês e preparava na casa, hoje eu compro de um fornecedor do jeito que eu quero. Cerca de 40% do que nós produzimos hoje é produzido fora da casa, especialmente para gente, graças a parcerias que fomos conquistando.

Outra coisa que mudou é que quando eu comecei, eu gostaria de abrir outras hamburguerias no mesmo formato da Orginal Co, hoje eu penso em formatos menores, com poucos produtos, para a pessoa comprar e levar, a exemplo do que acontece no exterior.

Por que tanta importância para as áreas de produção do restaurante?

Daniel – A área destinada ao salão da Original Co, ou seja, onde os clientes comem, equivale a apenas 35% do tamanho da casa. Eu precisava de um espaço para produzir com qualidade e dar conforto para minha equipe. Mesmo que nós não controlemos mais todos os processos, o essencial nós não abrimos mão de controlar. Nós limpamos a nossa carne, moemos e moldamos; produzimos todos os nossos pães e também toda a confeitaria.

Dario – Eu não acredito que você consiga atender bem as pessoas se sua área de trabalho for menor que a área de salão, simples assim. Mais espaço de preparo permite mais organização, higiene e agilidade no serviço. Eu costumo falar para as minhas equipes que a gente mais limpa e organiza do que cozinha.

Dario, o que o público pode esperar do seu Madê Cozinha Autoral?

A cozinha autoral é quando há um cozinheiro que cria um menu baseado nas suas experiências gastronômicas. No meu caso, vou trazer um cardápio com influências dos vários locais pelos quais passei nesses anos todos nas mais variadas cozinhas. Quem vier ao Madê vai encontrar uma cozinha de comfort food, com pouca manipulação, preparos rápidos, pouco tempo de cozimento e ingredientes frescos.

Madê significa ‘fazer à mão’ na língua bahasa e essa é uma tendência nacional que Santos tem acolhido: o handmade, as marcas autorais. o Madê vem para somar a este movimento?

Sim, nós buscamos esse caráter de produção orgânica, não com relação aos ingredientes, mas por tudo ser feito por nós mesmos. Eu tenho acompanhado alguns eventos em Santos e fico muito animado com tantos segmentos novos de pessoas fazendo à mão.

“O que faz a Original Co. ter fila na porta é o fato de ter fila na porta” (Daniel Maggi)

 

Daniel, qual o grande diferencial da Original Co. com relação às outras hamburguerias de Santos?

Com certeza o feito à mão, o home made. Conseguimos chegar em um padrão de qualidade em nosso pão, por exemplo, que a receita não oscila mais, mesmo que seja feito à mão. O nosso controle sobre os processos mais importantes também é um grande diferencial e por isso temos conquistado um espaço no segmento de food service que antes Santos não tinha. Esse mercado não olhava muito para nós e hoje, por exemplo, só a Original Co. garante duas toneladas de carne por mês ao nosso fornecedor.

 

“Eu não quero preparar coisas mirabolantes, tipo um pato que vira estrela quando o cliente põe na boca” (Dario Costa)

A experiência gastronômica vai além da comida, né?

Daniel – A experiência gastronômica é o todo. No nosso caso, o cliente entra em uma casa toda restaurada, com containers cortados à mão, madeira de canela, janelas da década de 20, tudo feito com carinho. Eu mesmo tive que aprender a restaurar, a colocar a mão na massa, por falta de mão-de-obra e trouxe para o ambiente tudo o que mais gostei dos lugares por onde passei.

Dario – Eu vivenciei cozinhas maravilhosas, onde tudo funcionava de maneira perfeita, mas isso era alta culinária e não funcionaria aqui. Tudo o que eu vou trazer para cá e que o Daniel também já faz é altamente comercial, fácil de entender, é uma experiência que tem a ver com o público da cidade. Quer algo mais simples que hambúrguer e peixe na brasa? Apesar de o público santista estar mais aberto, ainda precisamos tomar alguns cuidados com experiências muito complexas.

Dario, a comunicação do Original Co. evidencia o uso de produtos frescos e regionais. O Madê vem com essa preocupação de valorizar o que é local também?

Sim, nós vamos tentar usar o máximo de produtos locais e valorizar os produtores regionais. É claro que nem tudo é possível, mas, por exemplo, eu tenho uma grande amiga do Vale do Ribeira que produz palmito orgânico. Além de consumir o palmito dela, ela também virá aqui para ensinar nossa equipe a limpar a haste do palmito e manipular.

Nós também estamos trabalhando com uma ceramista local, a Barbara Anderaos, que eu conheci em um desses eventos handmade em Santos. Os nossos pratos estão sendo desenvolvidos por ela exclusivamente para o Madê, com características bem regionais e todos eles têm uma história para contar.

Diego Brígido

Jornalista e turismólogo
Editor da Revista Nove  e do Guia 9 de Bares e Restaurantes
Autor do fotolivro ‘Santos Paladares: pessoas que temperam a cena gastronômica santista’

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